Eu sou um pedestre convicto, pelo menos até eu mudar de idéia. Atravesso o campus da USP todo dia sobre as minhas duas pernas, cruzando as largas avenidas e as famosas rotatórias. Atravesso olhando para os dois lados, pois aparentemente esse layout viário é como um convite para os motoristas descarregarem suas frustrações no acelerador acertando, se tiverem sorte, um estudante ou dois no caminho.
Depois de muita enrolação, a prefeitura do campus resolveu o assunto instalando uma meia dúzia de semáfaros para o rebanho de alunos atravessar sem ser abatido. Eu deveria estar contentíssimo com o incremento na minha probabilidade de sobreviver à USP. Mas não. Eu odiei esses semáfaros. E não é porque eu tenho algum desejo inconsciente de comprar um carro veloz e sair atropelando polianos por aí.
Eu não gostei dos semáfaros porquê eles são, bem, feios. Não porquê poluem a paisagem ou outra viadagem desse tipo. São feios porque estragam um sistema que era belo. A beleza do trânsito organizado puramente pela combinação desses dois elementos, avenidas e rotatórias, é corrompida pelos sinais como se alguém escarrasse num Mondrian.
Voltando à vaca fria, admito que ainda não consegui uma resposta satisfatória sobre "o que é ciência da computação", mas tenho a impressão que a resposta envolve esse tipo de beleza. A criação de estruturas é uma constante na prática matemática moderna, mas o apreço ao minimalismo e à composibilidade me parecem marcas características da Ciência da Computação.
Um ótimo exemplo é a linguagem Lisp, onde todas as computações são funções e todo dado é uma lista. Outro exemplo é Smalltalk, onde tudo são objetos que se comunicam pela troca de mensagens. E como ficam as linguagens usadas por seres humanos normais? Retomando a analogia, Java parece um monte de semáfaros enfiados no pobre Smalltalk. E, embora eu nunca tenha programado em C++, ele me lembra um pouco o metrô de tokyo...